Sobre enfrentar a COVID-19 morando em situação precária

02/04/2020 | geral

Em entrevista concedida à Rede Globo do Rio de Janeiro, a arquiteta urbanista e co-presidente do IAB|RJ, Tainá de Paula fala sobre o desafio de convivência com uma pandemia, morando nas zonas periféricas.

A entrevista ocorreu em frente à Favela da Rocinha, na zona sul da capital Rio de Janeiro, concedida ao jornalista da Rede Globo Rio de Janeiro, Edivaldo Dondossola (E.D.).

E.D. (GLOBO) – Isolamento é muito importante nesse momento, mas em ambientes ventilados. Quem mora em comunidades muitas vezes não tem nem uma janela num cômodo. O que fazer nessas horas?

Tainá – É uma catástrofe. Infelizmente a gente está falando sobre moradia digna no meio de uma pandemia de coronavírus.  A maioria da população periférica e favelada do Brasil, vive em condições insalubres, em condições inadequadas, nas suas moradias. É fundamental a gente garantir [moradia adequada] não só para a população de risco, que pode vir a contrair o Covid-19, mas também aos doentes, os quais precisam ter uma moradia adequada para garantir a sua melhora rapidamente.

E.D. (GLOBO) – Agora, nesse momento de pandemia, você como arquiteta social, que dicas você daria para os moradores nesse momento? O que eles podem fazer para deixar o ambiente mais arejado pra evitar esse contágio interno?

Tainá – É fundamental garantir janelas, aberturas, vãos, principalmente no dormitório principal da casa; onde o doente ou os pacientes de risco têm que ficar obrigatoriamente nesse cômodo ventilado. E nas áreas úmidas, onde se cozinha…. nas cozinhas e nas áreas de serviço e as áreas úmidas de um modo geral. Fundamental também é a gente garantir que as paredes não estejam úmidas. Como é que a gente impede as infiltrações e faz os reparos necessários nessas infiltrações?  Mas, é importante também falar que as pessoas não têm condições de fazer isso sozinhas. A gente, corpo de técnicos, as entidades de arquitetos e urbanistas, se coloca à disposição… Mas, é óbvio que a gente precisa de um plano de melhoria habitacional emergencial, para além de habitações, de lugares adequados emergenciais para serem disponibilizados: como hotéis, como hospitais privados que foram estatizados em outros países, etc.

E.D. (GLOBO) – Tem que contar com a ajuda do poder público.  Agora que você falou, por exemplo da cozinha e ambientes úmidos. A gente sabe que é importante chegar em casa, tomar um banho, higienizar aquela roupa … Muitas vezes as pessoas que vivem em comunidades só têm um ponto de saída de água dentro de casa, que é usado para casa inteira. Isso também é um problema?

Tainá – Um problema grave. Nós passamos aqui no Rio de Janeiro uma grande crise hídrica, onde quase metade dos domicílios não tem acesso à água limpa, água tratada e à esgoto tratado. Então a gente vive uma injustiça sanitária muito grande no Rio de Janeiro e no Brasil como todo, em que essa realidade se repete. Como as pessoas muitas vezes vão usar um ponto de água pra fazer higiene de mão, pra fazer higiene de seus alimentos, pra fazer higiene das suas roupas, as pessoas usam o mesmo tanque para múltiplos usos. Por isso, é fundamental que a gente garanta pontos de água, acesso à água potável, para a ampla maioria dos moradores dessas comunidades.

E.D. (GLOBO) – E aí a importância do papel poder público nesse momento. Garantir um direito que é básico para as pessoas, que não é garantido para os moradores dessas comunidades.

Tainá – Claro. Infelizmente a gente vai começar a falar de moradia digna, adequada, nas habitações a partir da pandemia do coronavírus. Mas, eu espero que a gente inicie um ciclo de discussão da moradia do brasileiro.

O LINK DO VÍDEO: https://www.youtube.com/watch?v=sjhkvFLNPBU

PARA SABER DA CRISE HÍDRICA: https://outraspalavras.net/crise-brasileira/a-catastrofe-da-agua-como-sintese-do-rio/

Foto de Moradias em Palhoça-SC I vaniaburigo
O trabalho em tempos de COVID-